quarta-feira, 20 de novembro de 2013

DIPLOMADOS DESEMPREGADOS

Escrevi recentemente um texto com o título "O Mundo Acabou".* Não sei se quem leu entendeu o que eu queria dizer. Muitos acham que sou pessimista. Se isso for verdade, pelo menos não sou o único.
Os intelectuais sempre problematizaram a condição humana e raros foram otimistas quanto ao futuro do homem civilizado. Freud, em 1930, escreveu:

"A questão fatídica da humanidade parece-me ser saber se, e até que ponto, o seu desenvolvimento cultural conseguirá dominar a pertubação de sua vida comunal causada pelo instinto humano de agressão e autodestruição." (O mal-estar da civilização, p. 111)

Esse instinto vale tanto na perspectiva individual quanto coletiva, social. O pessimismo de Freud fazia sentido. As pessoas, esclarecidas ou alienadas, cada vez mais são descartadas "pela economia" e não encontram alternativas dignas para viver.
Indivíduos formados em faculdades, que antes se consideravam de classe média - com boa moradia, carros e poder de consumo -, tornaram-se moradores de rua em países como Grécia, Portugal ou Espanha.  Na África não é diferente:

 “(…) parte de um grupo nacional chamado Diplomados Desempregados. Eles juntaram forças ao protesto de cerca de 160 membros do movimento, que tinham como objetivo ocupar um edifício administrativo do Ministério do Ensino Superior. (…) A taxa de desemprego oficial de Marrocos é de 9,1 por cento a nível nacional, mas é 16 por cento entre os trabalhadores qualificados.” **

Diplomados Desempregados? O problema na África é mais grave pois muitos adotam a auto-imolação para chamar a atenção das autoridades. O protesto assume a sua forma mais radical.
De certa forma, Eric Hobsbawm, em 1999, previu o que acontece atualmente no mundo:

"... [a economia] está lançando um número crescente de homens e mulheres numa situação que não podem mais recorrer a regras claras, perspectivas, senso comum: uma situação em que não sabemos mais o que fazer de nossas vidas, tanto no plano individual como no coletivo. (...) não consigo olhar o futuro com muito otimismo." (O novo século, p. 194)

De fato, não é um crise passageira. Trata-se de uma mudança estrutural no capitalismo. A questão não é ser otimista ou pessimista. Basta ler os jornais. A realidade está aí e as pessoas não acreditam mais em projetos coletivos. 
Mesmo os alienados percebem que existe algo de errado no ar... Sofrem as consequências do que acontece no mundo mas não compreendem a dor e apelam para a ilusão de que "um dia tudo vai melhorar" ou se apegam aos dogmas de alguma religião. 
A crise social agrava a crise individual. Ninguém é intocável. Não existe mais volta e todos estão no mesmo barco.

 
(*) http://flertar.blog.com/2013/11/07/o-mundo-acabou/

(**) BAKRI, Nada. Self-Immolation Is on the Rise in the Arab World. New York Times, 20/01/2012. http://www.nytimes.com/2012/01/21/world/africa/self-immolation-on-the-rise-in-the-arab-world.html?_r=1&smid=tw-nytimes&seid=auto

domingo, 17 de novembro de 2013

CULPA E INSÔNIA

A noite chega e o sono não. Os remédios não fazem efeito. Tema batido? Por que, então, você não dorme? A mente, como diriam os filósofos antigos, seria como um "cavalo selvagem"?

A questão fundamental é: você, com a sua idade e a sua experiência de vida, está (hoje, no presente, no aqui e agora) no lugar e na situação que você imaginava quando era mais novo (a)?

Nada de "enganar a si mesmo". O seu projeto de vida deu certo até agora?

A avaliação do tipo custo-benefício na vida (entre os bons e maus momentos) não resolve o incômodo atual. Falta algo.

O "vento virou", diria Corinne Maier, não existe mais segurança nem estabilidade.

Experiência profissional, aposentadorias, empresas sólidas (como as do Eike Batista?), diplomas e carreiras tornaram-se expressões vazias, como se não estivessem conectadas com a prática cotidiana do mundo real.

Encontrar o culpado pode ajudar a compreender o processo atual mas, definitivamente, não resolve o problema.

O mal-estar permanece. A insônia, no contexto atual, talvez seja um dos menores problemas.

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

"BURNOUT"

Existem características em comum entre a depressão e o “burnout”:
. o sentimento de vazio;
. a falta de motivação;
. o desinteresse pelo que acontece no mundo exterior;
. a falta de preocupação com as pessoas mais próximas, como amigos e familiares;
. a autoestima praticamente desaparece.

As diferenças entre os dois casos são claras também.

Na depressão, o indivíduo carga a culpa e acredita que precisa ser punido. O peso que ele carrega pode levar ao suicídio.

O “burnout” é resultado do excesso de trabalho. Acontece mais com os jovens, que, no início, acreditam que os seus projetos serão realizados e reconhecidos. Alguns são utópicos, imaginam que podem transformar o mundo. São ambiciosos. Trabalham até mais de 60 horas por semana. Existe uma busca obsessiva pelo sucesso.

As consequências destas ações podem levar ao esgotamento físico e mental. Não realizar os seus projetos pode levar a sentimentos como depressão, ansiedade, inveja e raiva. Estes indivíduos são vistos pelos outros como fracassados.

Existe ainda uma diferença entre os que sofrem o processo de “burnout” e o depressivo: muitos colocam a culpa no outro (mercado, empresa, colegas, familiares...). Diante de tal quadro, tornam-se irônicos e o mal humor predomina. O que era idealismo é transformado em ceticismo.

Em suma, trata-se de uma “doença” produzida pelo neoliberalismo.

LEVEZA E DIVERSÃO

Os instintos básicos (alimentação, sono, vida sexual...) devem estar (constantemente) satisfeitos. Se isso não ocorre, acontece uma crise pessoal (esse não é o único tipo de crise, por exemplo, o nazismo foi uma crise coletiva, social).
Existem três formas comuns que um indivíduo utiliza para resolver uma crise pessoal:
Primeiro, troca a realidade pela fantasia. Ou seja, não admite que existe algo errado.
Segundo, preocupa-se com a vida do outro, com os problemas do outro. Trata-se de uma forma de desviar o foco (quanto a si mesmo).
Terceiro, admite a crise mas a culpa seria do outro. Não existe autocrítica.
Fugir da crise é difícil. Existe um incômodo no corpo, na mente. Aparecem sinais. Insônia. Manchas no corpo. Falta de apetite.
A origem da crise está no passado. Aconteceu algum trauma que a pessoa tem medo de passar por aquela situação novamente. Ela tenta apagar o trauma da memória, mas ele permanece no inconsciente.
O trauma “faz aniversário” e isso gera aquela tristeza sem explicação. A morte de um familiar, por exemplo, que aconteceu em 15 de fevereiro de 2001. Apesar do indivíduo ter vivido o luto e, teoricamente, ter superado a dor, quando chega fevereiro, aparece um certo mal estar.
O “aniversário” pode tornar-se, inconscientemente, um padrão. Ou seja, a pessoa acredita que em cada fevereiro acontecerá algo ruim.
Quanto mais traumas, mais “aniversários” e a vida torna-se mais complicada. Só piora a situação o fato de não admitir as frustrações, decepções e traições.
Não assumir o que o indivíduo é, de fato, o seu corpo, os seus desejos, a sua idade... Tudo isso cria um nó (ou vários) na vida da pessoa. Ela, com o tempo, se vê envolvida numa rede múltipla e caótica de problemas, crises, frustrações, decepções, traições (tanto explícitas no corpo e na mente, como ocultas).
Para melhorar, o indivíduo precisa, sinceramente, buscar a (s) causa (s). Fazer o percurso ao contrário: parte do incômodo do presente e caminha em busca de sua origem no passado.
Compreender o processo e saber o que acontece, de fato, no cotidiano, pode tornar a vida mais leve e divertida na medida em que o indivíduo descobre que não precisa ter medo do seu verdadeiro “eu” e nem do seu passado.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

ASSÉDIO SEXUAL


Dizem que as pessoas, especialmente as mulheres, são esnobes em Uberlândia. É verdade no caso da maioria. No que diz respeito ao sexo feminino, no entanto, seria interessante fazer algumas considerações.

Uma boa parte, entre as mulheres, não se enquadra no padrão de beleza atual. Assim, antes de sair, existe toda uma produção para que ela fique bela, isso sem falar nas cirurgias plásticas. Diante de tanto investimento, seria pouco provável que uma mulher se entregaria ao ouvir a primeira cantada vulgar de um homem bêbado com cheiro de cigarro e cerveja.

Por outro lado, toda essa produção pode provocar desconfianças diante dos outros:

"Engano possível sobre o corpo que os enfeites escondem e que se arrisca a decepcionar quando é descoberto; ele é rapidamente suspeito de imperfeições habilmente mascaradas; teme-se algum defeito repelente; o segredo e as particularidades do corpo feminino são carregados de poderes ambíguos." (Michel Foucault, O Cuidado de Si, p. 220)

Outro fato inegável é que as mulheres sofrem assédio sexual. Existe "(...) um 'olhar masculino', a forma como homens por sua obsessão voyeurista procuram manter as mulheres na posição de objetos sexuais que são passivos ao seu olhar." (Camille Paglia, Playboy, October 1991, p. 133)

Não é simples lidar com tal realidade. Por exemplo, “as anoréxicas defendem-se do olhar masculino refreando o desenvolvimento do próprio corpo.” (Kalu Singu, Sublimação, p. 61)

Outro problema é a alienação: uma coisa é admitir que "as mulheres, em sua maioria, precisam ser seduzidas e consideradas atraentes,"* outra é saber se elas têm consciência do que provocam nos outros. Camille Paglia cita exemplos:

"Vejo mulheres fazendo 'cooper' na rua com os seus seios para cima e para baixo e eu acho que elas estão loucas. Elas realmente não vêem que são um alvo de provocação ao correr.
(...) uma garota toma 12 tequilas numa festa de faculdade e um rapaz a chama para subir para o seu quarto e, então, ela fica surpresa quando ele a ataca?" *(Camille Paglia, Playboy, October, p. 170)

Isso não justificaria o estupro, afinal, toda mulher tem o direito de se vestir de uma maneira sensual sem ser atacada. O problema é se ela tem consciência do que provoca, de quais sinais ela estaria enviando aos outros? Se ela não for alienada, saberá certamente lidar com os olhares e as abordagens masculinas, sejam elas discretas ou não.

domingo, 3 de novembro de 2013

EXCESSOS

A noite é definida antes da pessoa sair de casa. O seu estado de espírito será determinante para dizer como será o dia seguinte.
Os excessos – bebidas, drogas, paqueras, brigas, entre outros – serão apenas instrumentos para realizar algo que já estava traçado pela pessoa. Tristeza, frustração e rejeição fazem parte deste processo. Alegria e satisfação também, dependendo do estado de espírito de cada um.
Existem pessoas que bebem ou cometem outros excessos para esquecer os problemas do cotidiano ou ainda algo mais grave, como um trauma na infância. Não resolve. Piora. Elas estarão bem piores no final da noite.
Alguns falam em ressaca moral, mas pode ser mais complicado. No caso de algum trauma, além do mal estar, elas terão que enfrentar, ao dormir, tudo aquilo que queriam esquecer... em pesadelos terríveis que parecem cada vez mais reais.
 A tentativa de fugir do inconsciente não funcionou. Ele é implacável e a dor produzida, invisível e solitária, é tão intensa que leva a alguns na escolha de algo até então impensável.
Tudo isso pode tornar-se um ciclo de autodestruição. As fotos produzidas para as redes sociais, com gente bonita e belos sorrisos, parecem não enganar mais, o mesmo acontece com a constante troca de elogios tanto pessoalmente como pela Internet.
O tempo passa e a situação piora. Ficar em casa, vendo televisão e comendo, pode ser pior. Engorda. Piora a já debilitada autoestima. Mais gorda, mais a pessoa quer ficar em casa, quer esconder do outro e de si mesma. Entretanto, o problema, como antes, não está na aparência física. Ele vem de dentro... A emoção não pode ser controlada e os erros – escondidos no inconsciente – insistem em voltar a incomodar, sobretudo em momentos de fragilidade.
Não existe solução. Alguns diriam que o tempo seria a melhor resposta. Talvez. Mas nem ele resolverá o mal estar existencial da condição humana.