O rock ‘n’ roll foi construído a partir do mito da juventude.
Isso significava vitalidade, beleza e protesto.
Velhos grupos de rock tornaram-se empresas.
Tudo seria vendido com o nome e a marca da banda. Neste contexto, os
músicos e os seus empresários ficaram milionários. O dinheiro não
deixaria de entrar nas contas.
A questão que insistiria em incomodar seria: por que continuar com shows ao vivo e longas excursões após os 60 anos de idade?
Vários shows dos Rolling Stones na Austrália e na Nova Zelândia, em
2014, tiveram que ser adiados (para novembro) por causa do suicídio da
namorada de Mick Jagger. Apesar do transtorno da mudança das datas, a
banda voltou (em novembro) para cumprir os contratos.
No meio na
“nova” excursão, deixaram de fazer outro show, ou seja, não fizeram na
data marcada e cancelaram o show na data adiada. Pelo menos não
prometeram (mais) tocar em Hanging Rock (Austrália). De acordo com a
imprensa, o cancelamento teria ocorrido “por conta de uma infecção na
garganta do cantor Mick Jagger. (...) Segundo um comunicado oficial, ele
tem ordens médicas para descansar as cordas vocais com o objetivo de
conseguir terminar a turnê no país.”*
Apesar de cuidar da saúde –
com exercícios físicos (e também para as tais cordas vocais), o
vocalista dos Rolling Stones está com 71 anos. Pintar os cabelos
(fazendo ainda inúmeras cirurgias plásticas) não significa congelar o
tempo. Os músicos tornam-se caricaturas do que foram no passado. Por
tratar-se do rock ‘n’ roll, as coisas pioram na medida em que precisam
manter a imagem de jovens e rebeldes.
Outro caso em 2014 foi o
Deep Purple. Vi vídeos do show da banda em Brasília e a aparência física
do vocalista Ian Gillan representa a síntese da decadência. Para
complicar ainda mais a situação, ele utiliza o suporte do microfone com
uma bengala e a sua voz só aparece em alguns momentos das músicas (o que
predomina, não por acaso, são os solos dos músicos). Lucas Esteves
escreveu sobre esse show em Brasília:
“Para além do fato de que a
grande banda iniciou o show com a quase desconhecida ‘Apres Vous’, do
novo ‘Now What?!’, o que realmente causou surpresa foi o estado físico
lamentável do vocalista IAN GILLAN. Totalmente sem voz e apoiado no
pedestal aparentando estar às portas do desmaio, o Silver Voice assustou
seriamente a plateia, que o via puxar o fôlego com grande dificuldade,
exibir expressões de dor e grande cansaço. Foi praticamente incapaz de
cantar a nova composição. A cada parada na voz, seguia para trás do
palco.
(...) ‘Está bêbado?’ ‘Está drogado?’ foram algumas das
questões feitas pelo público que estava na plateia. Entretanto, com o
histórico de moderação assumido pelos vovôs já há algum tempo devido à
idade, não parecia ser o caso. Com o tempo, e a chegada de “Hard Loving
Man” e “Strange Kind Of Woman”, sofríveis nos vocais e excelentes no
instrumental, foi possível perceber que a possibilidade mais óbvia era
de que Ian Gillan estava bastante doente e que corria para a coxia em
busca de nebulização. Ao voltar, aguentava alguns segundos a mais e logo
voltava a convalescer intensamente."
A situação do Deep Purple
“como empresa” é problemática no mundo do rock, afinal, do grupo
original só restaram o vocalista, o baixista e o baterista. Para muitos,
não existiria Deep Purple sem o excelente guitarrista Ritchie
Blackmore. Os empresários não pensam desta maneira e os músicos que
ainda “carregam o piano” para “manter” o nome da banda vestem-se como
jovens e se arriscam bastante (em termos de vexames) em suas exposições
públicas.
Em comparação, pelo menos em termos de (aparente)
vitalidade (com base nos shows que aparecem no You Tube), os Rolling
Stones estão bem melhores do que o Deep Purple. Entretanto, essa não é a
questão chave. O problema é por que esses velhos senhores ainda
insistem em parecer jovens e repetir o que, um dia, foram no passado?
Não possuem autocrítica (ou espelhos)? Não admitem que o tempo passou?
Não aceitam que as coisas mudam e que os papéis não são sempre os mesmos
(em termos de aparência e de saúde mesmo) nas diferentes fases da vida?
O envelhecimento é um fato e a morte é certa para todos. Com o
tempo, aliás, não se expor (em excesso) pode ser um boa alternativa.
Isso não quer dizer desistir de viver. Isso significa só admitir que,
diferente de quando se tem 20 anos, depois dos 50 não dá mais para
querer ser o centro das atenções a partir da aparência física.
(*) Com infecção na garganta, Mick jagger cancela show de turnê na Austrália. Folha de São, 07-11-2014. http://www1.folha.uol.com.br/
(**) Lucas Esteves. Resenha - Deep Purple (Net Live, Brasília, 07/11/14) http://whiplash.net/materias/shows/213739
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