segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

A solidão

Acho fantástica a música escolhida pelos torcedores do Liverpool: "You'll Never Walk Alone" (“Você nunca caminhará sozinho”). Ela reforça a ideia de união, de grupo e de clube. Mais do que isso, ela dá a impressão que o indivíduo nunca estará sozinho (na vitória ou na derrota).
Na sociedade, de fato, o indivíduo, desde o nascimento, é “protegido” por grupos inventados pelos homens no sentido de combater a solidão: os familiares, os amigos, os colegas da igreja, as turmas nas escolas, entre tantos outros exemplos.
A solidão, implicitamente, é vista como inimiga. Ela deve ser evitada. O indivíduo necessita estar protegido por outros indivíduos.
Trata-se de uma ilusão. O indivíduo nasce e morre sozinho. A companhia de várias pessoas no seu quarto de hospital não altera o que seria a sua passagem para “a outra dimensão”. Essa é uma tarefa que será feita só por ele.
O indivíduo comum, pela sua própria formação, evita a solidão. Ele prefere estar no meio dos grupos e das multidões. Não importa se a sua solidão torna-se mais clara mesmo quando está com inúmeras pessoas em sua volta. Ele prefere assim. Acredita que isso evita o pior: pensar em si mesmo.
O irônico é que participar dos tais grupos (familiares, amigos, colegas da igreja ou turmas nas escolas) significa se submeter a regras. Existem listas do que se pode fazer ou não, por exemplo, em um grupo de adolescentes.
Este processo, na fase de desenvolvimento do indivíduo, pode ser rompido quando chega o namoro. O que era um grupo torna-se um casal. Muitas vezes, esse casal fecha em si mesmo. Dispensa ou é dispensado pelo grupo que participava. Pouco importa.
A emoção predomina no casal, naquele tipo que namora verdadeiramente, que é fiel, que não consegue imaginar o futuro um sem o outro.
Se o namoro demora anos, ocorre, obviamente, o distanciamento do antigo grupo.
Esquecem os amigos e são esquecidos por eles.
O problema aparece com o fim do namoro. O indivíduo (pode ser pela primeira vez) encontra-se sozinho. Bate o desespero. A solução, normalmente, seria começar (o mais rápido possível) outro namoro. Isso funcionaria até que um dia o que era namoro vira casamento e (muitas vezes) com filhos.
O divórcio é quase uma certeza, mas (neste contexto) parece ser secundário porque o indivíduo terá que lidar sempre com a ex e com os filhos, enfim, não ficará sozinho.
Não ficar sozinho, envolver-se com os problemas dos filhos nas escolhas (entre outras coisas), não significa não viver na solidão.
No final, alienado ao longo da vida pelos aparelhos ideológicos do Estado, o indivíduo, a qualquer momento, mesmo no meio de uma multidão, se dá conta da própria solidão. Ele olha em sua volta e não reconhece coisa alguma exceto falsidades, traições e conspirações.
O indivíduo, neste momento, pensa se realmente valeu a pena sacrificar o seu desejo para obedecer as regras impostas por todos os grupos pelos quais passou. Ele percebe que deixou de viver a sua vida em nome dos outros para não ficar sozinho e, no final, o que ele efetivamente sente é a solidão, algo que não sabe explicar e que os outros não querem saber.
O chato não é sentir a dor da solidão ou saber que a morte é a única certeza. O complicado é ter deixado de ser ele mesmo, é ter deixado de fazer as próprias escolhas, é ter deixado de ter vivido os seus verdadeiros desejos (tudo em nome de leis e normas ditadas por pessoas - de grupos – que, na primeira oportunidade, o deixariam sozinho, irreconhecível, sem uma identidade).

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