terça-feira, 13 de março de 2012

PODER & SADOMASOQUISMO

Faz algum tempo que tento entender a relação entre a tortura que o catolicismo fazia na Idade Média, o cilício e o auto-flagelo, os métodos de tortura do nazismo e o elogio da dor feita pelos adeptos do sadomasoquismo (SM).
Como compreender que existem pontos em comum em práticas supostamente tão diferentes como a religião, a política e o sexo
O nazismo ainda exerce grande fascínio entre as pessoas, inclusive em relação ao processo de "produção da dor". Muitos adeptos do SM utilizam uniformes nazistas em suas práticas. Jimmy Page usava um "Nazi SS Storm Trooper Hat" em alguns shows do Led Zeppelin. Sobre o SM, numa entrevista com Tony Barrell em 2010, diante da sugestão de que Page teria simpatia por essas práticas, o guitarrista responde: 
"Eu tenho certeza que alguns de seus leitores podem ter flertado com o SM.
(...) Eu tenho um apetite voraz por todas as coisas desse mundo ou não ('unworldly')." 
Em uma resposta bastante vaga, de fato, Jimmy Page não negou o seu interesse pelo SM.
O filósofo francês Michel Foucault era um defensor do SM  (Dit et Ecrits, p. 1556-1557):
"A idéia de que o SM está relacionado com uma violência profunda, que a sua prática é uma forma de liberar essa violência, para dar vazão à agressão é uma idéia estúpida. Temos muitas pessoas boas que não são agressivas, elas apenas inventam novas possibilidades de prazer, utilizando reconhecidamente partes estranhas de seus corpos." *
Essa defesa era coerente com a sua concepção de poder, ou seja, o poder não estaria no Estado (A Vontade do Saber, p. 88) e sim existiria uma "onipresença de poder (...) o poder está em toda parte; não porque englobe tudo e sim porque provém de todos os lugares." (A Vontade do Saber, p. 89) 
Entretanto, nem todos concordam com o conceito de poder de Foucault. Em "Nothing Mat(t)ers: A Feminist Critique of Postmodernism", é dito:
"Foucault pensa que o nosso prazer é a nossa dor, incesto e seu tabu seriam jogos de poder. A intimidade da violência não é o seu gozo. Claro, se nós não gostamos disso, somos informados, não pode haver fuga. Resistir já está inscrito, constituído, contido, absorvido, é impossível. É isso mesmo? Isso significa que só podemos realizar o prazer e o poder de Judith, que dormia com o rei Holofernes para cortar a cabeça dele? Porque é isso que ele deseja, se não houver outra história." **
Essas críticas fazem sentido. As práticas do SM, por exemplo, não significam somente novas possibilidades de prazer, elas estão associadas normalmente aos abusos sofridos na infância e a uma recusa ao processo psicoterápico. 
Para Michel Foucault: "(...) as relações de poder são (...) intencionais (...) não há poder que se exerça sem uma série de miras e objetivos." (A Vontade do Saber, p. 90)
Isso significa, por exemplo, que uma bela mulher, dançando de maneira sensual e com roupas provocantes, estaria num jogo de sedução com os homens, o que poderia levar, em alguns casos, ao estupro, e ela, a mulher, não poderia ser definida como vítima no processo. Trata-se de um tese equivocada.
De fato, independente do ponto de vista, o que une as práticas da religião, da política e do sexo, na perspectiva de análise desse texto,  parece ser mesmo a violência. Ela serviria para omitir as verdadeiras causas dessas práticas. Certamente a dominação do outro e a fuga de si estariam entre elas. 
............................................................................
* "L’idée que le S/M est lié à une violence profonde, que sa pratique est un moyen de libérer cette violence, de donner libre cours à l’agression est une idée stupide. Nous avons trés bien que ce que ses gens font n’est pas agressif; qu’ils inventent de nouvelles possibilités de plaisir en utilisant certes parties bizarres de leurs corps – en érotisant ce corps."
** Foucault thinks our pleasure’s our pain; incest and its taboo is a game of please and power (‘perpetual spirals of power and pleasure’). The intimacy of violence is not its enjoyment. Of course, if we don’t like that, we are told there can be no escape. Even our resistance is already inscribed, constituted, contained, absorbed, impossible. Is that so? Does this mean that we can only perform with the pleasure and power of Judith, who slept with King Holofernes to cut off his head? Because that is what he desires, if there is no other history."

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.