quarta-feira, 30 de setembro de 2015

José Guilherme Merquior, Michel Foucault & Karl Marx

Não tenho paciência com gente que deseja parecer superior intelectualmente, esconde-se atrás de termos complexos e longos parágrafos, mas que, de fato, não apresenta originalidade alguma. Também não gosto de “muito barulho por nada”, como quando José Guilherme Merquior quis corrigir os intelectuais brasileiros sobre os termos que seriam corretos associados ao pensador Michel Foucault:

“(...) este antipanegírico de Foucault nasceu de uma constatação irritante: a de que, na maioria esmagadora dos casos, a tribo foucaldiana (entre nós, barbaramente autodesignada como ‘foucaultiana’) tem o hábito de ignorar sistematicamente o volume e a qualidade das críticas feitas às proezas histórico-filosóficas de seu ídolo.” (José Guilherme Merquior, Michel Foucault ou o Niilismo de Cátedra, p. 9)

Apesar da explicação (típica) de José Guilherme Merquior, prefiro utilizar o termo “foucaultiano” nos meus textos opinativos. Não seria para implicar com Merquior, aliás, sempre li os livros dos pensadores brasileiros de direita (como Paulo Francis, Nelson Rodriguez, entre outros). Não concordo com suas teses. No entanto, isso não seria suficiente para impedir qualquer tipo de leitura.

Eu não sou “foucaultiano”. Ele aparece bastante nas citações dos textos opinativos por um motivo óbvio: são textos que tratam do cotidiano e os marxistas (por exemplo) nunca se preocuparam em discutir objetos como sexualidade, loucura ou presídio.

Dito isso, eis a problemática de hoje: o que fazer quando a profissão que escolheu – e após décadas – parece não lhe dar mais prazer? Penso aqui no tipo de indivíduo que acredita que o seu trabalho contribui também para a sociedade (e, portanto, não trabalharia só por dinheiro).

Michel Foucault, após trabalhar (décadas) como professor e ter ficado conhecido como uma dos principais intelectuais do mundo por causa das publicações de seus livros, pensou seriamente em abandonar tudo e começar com outra profissão:

“Foi na época em que queria sair do Collège de France. ‘Uma coisa é certa, não vou recomeçar o meu curso no ano que vem,’ diz no início de 1984 a Pierre Bourdieu (...) Foucault falava também, várias vezes, em parar de escrever. (...) Foucault acha que o preço a pagar pela ‘glória’ é alto demais. Porém o que pode fazer? Como mudar de vida quando se tem quase sessenta anos? Ele pensa no jornalismo. Gostaria de escreve crônicas sobre geopolítica.” (Didier Eribon, Michel Foucault – Uma Biografia, p. 301)

Dar aulas pode tornar-se repetitivo. Faltam, algumas vezes, desafios. Agora escrever deveria ser um prazer. Foucault não pensava assim. A fama e ‘glória’ podem ser, pelo seu discurso, cansativas.

“(...) ‘a gente começa a escrever por acaso e continua pela força circunstâncias.’ Repete que escrever não é uma atividade que realmente ele escolheu.” (Didier Eribon, Michel Foucault – Uma Biografia, p. 301)

Michel Foucault não realizou os seus desejos porque faleceu em 1984.

Um outro autor (mais importante do que Foucault) que viveu em uma época diferente: Karl Marx. Foucault vinha de uma família rica, Marx não. Foucault queria mudar de profissão, Marx não. De fato, apesar de ser nietzscheano, Foucault admitia que as leituras das obras de Freud, Marx e Nietzsche foram fundamentais na sua carreira.

Marx, na velhice, “sentia-se menos capaz das campanhas ativas de sua juventude e anos intermediários; o excesso de trabalho e a pobreza tinham-lhe minado a resistência; vivia cansado, com frequência enfermo, e começou a preocupar-se com a saúde.” (Isaiah Berlin, Karl Marx, p. 246) Além disto:

“A impaciência e irritabilidade aumentaram com a velhice e ele tomou cuidado para evitar a companhia de pessoas que o aborreciam e a quem desagradava com suas opiniões. Tornou-se mais difícil no relacionamento pessoal.” (Isaiah Berlin, Karl Marx, p. 246)

Provavelmente os exemplos citados (principalmente no caso de Marx) não serviram muito para responder o que seria a problemática central deste texto. Contudo, as ideias aqui apresentadas podem servir como reflexão no sentido do que fazer e como se comportar quando a crise da meia idade deixa de ser só um conceito (distante) e torna-se uma realidade.

© profelipe ™ 30-09-2015

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